terça-feira, 21 de janeiro de 2014

estreia em março na Torre Malakoff

O processo criativo e a biografia do artista curitibano são tema de mostra "Múltiplo Leminski"

Mostra, com fotos, textos, objetos e vídeos, já passou por Curitiba, Goiânia e Foz do Iguaçu. Foto: Dico Kremer/Divulgação

Mostra, com fotos, textos, objetos e vídeos, já passou por Curitiba, Goiânia e Foz do Iguaçu. Foto: Dico Kremer/Divulgação

Se estivesse vivo, o curitibano Paulo Leminski (1944-1989) completaria 70 anos em 2014. Mas, de certo modo, é como se nunca tivesse morrido. Sua produção foi tão genial e vasta que o escritor, poeta, tradutor, professor, crítico literário e ainda faixa preta de judô se perenizou através de sua obra. Parte expressiva deste legado será trazida ao Recife na exposição Múltiplo Leminski, que abre ao público no dia 28 de março, na Torre Malakoff, no Bairro do Recife.

Na semana passada, Aurea Leminski, filha do artista, que divide a curadoria coletiva do projeto com a irmã, Estrela, e a mãe, a poeta Alice Ruiz, esteve na capital pernambucana para acertar detalhes da mostra. Segundo ela, não há uma pessoa que não se surpreenda com a proposta, pois facetas menos divulgadas de Leminski estão presentes, a exemplo de sua atuação como publicitário, músico (ele criou não apenas letras, mas também melodias famosas, em parcerias com Moraes Moreira e Caetano Veloso, entre outros), desenhista de quadrinhos eróticos. O designer Miguel Paladino, que assina ambientação e cenografia, também acompanhou Aurea na visita à Malakoff.

“Escolhemos o Recife porque uma das obras emblemáticas de Leminski, Catatau, cita justamente a chegada de Descartes em frente à Torre Malakoff, para acompanhar a corte de Maurício de Nassau e suas reações imaginárias, estabelecendo uma conexão direta com a cidade”, justifica Aurea Leminski. Ela lembra que a exposição conta com acesso gratuito, e outras atividades além do passeio pelos corredores e salas do monumento no Recife Antigo. “Contaremos com palestras, oficinas educativas, grafites em espaços públicos, intervenções urbanas e ainda o show Essa noite vai ter sol, com Estrela e banda”.

Múltiplo Leminski vem batendo recordes de público nas cidades em que já foi vista. Começou em 2012, na terra natal do artista, no Museu Oscar Niemeyer (MON), e foi vista por cerca de 200 mil pessoas. Mais 130 mil visitaram o projeto em Foz do Iguaçu. Até 9 de março, estará no Centro Cultural Oscar Niemeyer, em Goiânia (GO). Tanto lá quanto no Recife, a exposição chega pelo Programa Petrobras Cultural. No segundo semestre, irá a Salvador, e a família estuda a chance de aportar no Rio de Janeiro, em 2015.

“O acervo é nosso e a gente cuida de tudo pessoalmente. Da escolha do local, de fazer a montagem. Nossa ideia era fazer uma homenagem de caráter mais festivo, revelar o lado mais criativo de Leminski, criando uma atmosfera poética para entrar neste universo”, pontua Aurea. “Muitas canções dele fizeram sucesso na voz de outros. As pessoas cantam as letras sem nem saber que eram dele”, compara, citando exemplos, como Verdura, de Caetano.

 (Foto: Jose Vieira/Multiplo Leminski/Di)

Entre outras preciosidades, será possível encontrar desde guardanapos e papéis de cigarro com anotações, a originais dos livros, passando pela máquina de escrever de Leminski, que mantinha o “escritório” na sala de casa. “Ele era vibrante, latente, estava sempre em plena ebulição intelectual. Gostava de roubar a cena, mas ao mesmo tempo era extremamente generoso. Participou do ciclo acadêmico dos concretistas, mas não deixava de receber artistas novos”, depõe Aurea.

Panorama

Entre as áreas da exposição, estão a Usina Leminski, o espaço que reproduz a biblioteca do escritor e seus livros preferidos, além de uma mostra audiovisual, com documentários, palestras dele, porta-retratos digitais. O tempo recomendado para visitar a mostra é de, no mínimo, duas horas. O audioguia é bilíngue, em português e inglês, enquanto o livreto estará disponível ainda
em espanhol.

Múltiplo Leminski, que deve ficar em cartaz até a primeira semana de junho na Malakoff, é a maior exposição sobre Leminski já realizada até hoje. Outras iniciativas já ocorreram em São Paulo, como a Ocupação no Itaú Cultural, para lembrar os 20 anos de sua morte, e a do Sesc Consolação, que tinham cenografia de Miguel Paladino.

Leminski era um apaixonado pela cultura oriental, da qual se aproximou a partir do judô. Estabeleceu uma relação com a filosofia zen e daí começou a criar os haicais, poemas em pílulas. “Ele escrevia de forma surpreendente, mas sucinta, que se conecta à informação rápida de hoje nas redes sociais”, observa a curadora.

Textos

Sem título


Ai daqueles
que se amaram sem nenhuma briga
aqueles que deixaram
que a mágoa nova
virasse a chaga antiga
ai daqueles que se amaram
sem saber que amar é pão feito em casa
e que a pedra só não voa
porque não quer
não porque não tem asa

Não discuto

não discuto
com o destino
o que pintar
eu assino

Bem no fundo

No fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto
a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo
extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais
mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.

Parada cardíaca


Essa minha secura
essa falta de sentimento
não tem ninguém que segure,
vem de dentro.
Vem da zona escura
donde vem o que sinto.
Sinto muito,
sentir é muito lento.

Fonte:www.diariodepernambuco.com.br

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